Angela Moulin Simões Penalva Santos é economista e doutora e pós-doutora em Planejamento Urbano e Regional (FAU/USP). Ela é autora de “Política urbana no contexto federativo brasileiro – aspectos institucionais e financeiros”, publicado em 2018 pela EdUERJ. O lançamento do livro será no dia 26 de abril, às 19h, na Blooks Livraria, em Botafogo.
Ela conversou sobre o seu livro com o Blog da EdUERJ:
Gostaria que falasse um pouco do processo de pesquisa do livro Política urbana no contexto federativo brasileiro.
Esse tema emergiu quando estava discutindo o desenvolvimento da economia fluminense e iniciei uma investigação sobre o papel dos governos municipais. Daí fui induzida a investigar o papel do Município no federalismo brasileiro, o que resultou numa participação num seminário em Bogotá, na Universidade Nacional de Colômbia, sobre processos de descentralização das políticas sociais na América Latina, em 2005. Ao ter que analisar o processo histórico das relações federativas e situar o Município no federalismo brasileiro, deparei-me com tantos desafios que resolvi aprofundar a investigação.
Como surgiu o interesse pelo tema?
O meu interesse surgiu em decorrência da pesquisa sobre o desenvolvimento local, tomando os municípios fluminenses como referência do protagonismo municipal.
Dentro de um contexto de política federativa, quais são os entraves à gestão de um município?
Existem muitas questões que historicamente são resolvidas em escala municipal, no Brasil e em outros países. A política urbana é uma típica questão local, mas envolve questões não apenas regulatórias como também fomento à infraestrutura urbana, o que suscita discutir o federalismo fiscal. Essa discussão torna-se ainda mais relevante pela decisão dos constituintes de 1988 em transferir a execução das políticas sociais para os governos municipais, elevando a importância das fontes de financiamento municipal.
Além da inadequação do federalismo fiscal brasileiro, existe ainda outra questão que merece atenção das políticas públicas. Trata-se do fato de que o Município no Brasil foi elevado à condição de ente federativo e, portanto, contanto com uma autonomia muito maior do que em outros países. Ocorre que as fronteiras municipais tendem a não coincidir com a das cidades de médio e grande porte, as quais formam aglomerados urbanos, alguns dos quais de porte metropolitano, como é o caso do Rio de Janeiro, cuja região metropolitana é constituída de 21 municípios, todos considerados entes federativos. Nestas condições a gestão destes territórios demandam uma ação coordenada para implementar e financiar política urbana, o que não tem sido um objetivo fácil de ser logrado.
No livro, você cita o fato de a constituição de 1988 ter reconhecido o município como ente federativo. De que forma você analisa os impactos desta mudança?
Devo acompanhar muitos analistas que consideram que houve grande fragmentação na gestão territorial. Mas também precisamos admitir que houve uma capilaridade inédita nas políticas sociais, estruturadas para serem executadas em escala municipal. A descentralização das políticas sociais a serem executadas pelas prefeituras levou cidadania aos moradores dos municípios espalhados por todo o território nacional.
Depois da constituição, houve muitos instrumentos jurídicos que interferiram na questão dos municípios. Você acredita que as modificações propostas foram bem sucedidas (em termos de tendência)?
No âmbito da política urbana eu diria que houve uma superestimativa da ação dos instrumentos jurídicos. O caso do uso do IPTU progressivo para os imóveis que não cumprem a função social é um flagrante exemplo mal sucedido, já que não chegam a uma dezena os municípios que regularizaram o instrumento, num universo de 5.570 municípios brasileiros. Mas houve um avanço normativo que fez evoluir ações públicas e modificar a agenda da política urbana.
O livro aponta para a distância entre a cidade do plano e a cidade real. Qual o motivo de a cidade almejada pelos legisladores não se realizar?
A disputa pela terra urbana, tornada um instrumento de acumulação de capital.
Por fim, trata-se inegavelmente de uma obra multidisciplinar, com aspectos que vão da economia, história, administração pública a outras áreas. A qual público você espera alcançar com o seu livro?
Aos gestores urbanos e pesquisadores de temas relacionados à gestão urbana. Em particular, espero participar do diálogo acadêmico sobre o desenvolvimento urbano, difundindo a agenda urbana nos programas de pós-graduação e, quem sabe, contribuindo para fazer avançar a ação dos governos municipais em prol de cidades socialmente mais inclusivas.