Um dos destaques do site da EdUERJ em 2020 é o livro “Divulgando ciência: o que alguns cientistas fazem e como isso afeta sua vida”. A publicação, que tem um enfoque na educação ambiental e na divulgação científica, está disponível para download gratuito e reforça a importância da pesquisa e da ciência na vida de todos. O Blog da EdUERJ conversou com as organizadoras do livro, Luciana de Moraes Costa e Elisabete Captivo Lourenço (da esquerda para direita, na foto).
Qual foi a motivação que levou a produzir um livro relacionado a divulgação científica?
A necessidade da divulgação científica para o público leigo.
Nós começamos a perceber que muitos resultados obtidos em pesquisas científicas não chegavam ao público de fora da academia.
Muitas pessoas não sabem a importância da nossa pesquisa, da pesquisa feita no nosso país. A pesquisa científica no Brasil é desvalorizada por muitos.
Essas questões nos levaram a organizar uma disciplina chamada “Ações extensionistas, educação e popularização da ciência para projetos de pesquisas em ecologia e evolução” para o Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Evolução da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPGEE-UERJ).
A ideia da disciplina surgiu também através de experiências pessoais em nossas ações extensionistas, realizadas no Laboratório de Ecologia de Mamíferos – UERJ e no Projeto Morcegos na Praça ligado ao Laboratório de Artrópodes Parasitas da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (LAPAR-UFRRJ).
Cada aluno da disciplina pôde escrever um capítulo sobre o tema da pesquisa deles com uma linguagem que o público leigo pudesse entender. Essa obra foi um esforço coletivo nosso e de todos os autores que abraçaram a ideia e trabalharam duro para levar um pouco do que os cientistas fazem e como isso afeta a vida das pessoas no cotidiano.
A quem vocês recomendariam a leitura dessa publicação?
Recomendamos a leitura dessa publicação para todos. O livro reúne textos em uma linguagem própria e acessível ao público leigo. Mais especificamente, professores e educadores poderão promover o saber e os trabalhos de pesquisadores com a ajuda deste livro. Alunos do Ensino Médio e de graduação aprenderão mais sobre o mundo da pesquisa, ajudando em escolhas profissionais.
Qual foi o cuidado tomado para tornar o tema mais acessível?
A linguagem. Muitos pesquisadores estão mais acostumados a escrever para revista científica. Nós trabalhamos a linguagem de divulgação científica com os autores dos capítulos durante a disciplina.
Qual foi o maior desafio encontrado durante a produção do livro?
O maior desafio foi a própria linguagem. Os alunos escrevem monografia, dissertação, tese, artigos científicos. E a linguagem para o público acadêmico é diferente.
Uma outra questão foi a verba financeira para a publicação do livro. Gostaríamos de agradecer aqui ao financiamento que veio através da taxa de bancada do pós-doutorado da Dra. Luciana de Moraes. Agradecemos ao Programa de Apoio ao Pós-doutorado da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (PAPDRJ – FAPERJ/CAPES Processo: E-26/101.399/2014).
A ciência ainda é vista por muitos como um tabu. Por que isso acontece?
Existe um falsa impressão de distanciamento entre a vida cotidiana e a ciência. Isso se dá porque muitas pessoas, quando pensam em um cientista, a primeira imagem que aparece na cabeça são pessoas em laboratório, com jaleco branco ou aquele cientista maluco que vimos muitas vezes na internet, e/ou a ideia que um cientista sabe de tudo e que para fazer ciência é necessário ser muito inteligente. É realmente um estereótipo. O Livro aborda essa questão. Demonstrar que a ciência está próxima de todos nós, levar o cotidiano de como se faz ciência e de como é a vida de um cientista. Desmistificar o estereótipo do cientista e aproximar a ciência das pessoas demonstrando métodos, funções, aplicabilidade…
Como vocês acham que esse estereótipo pode ser combatido?
Com divulgação científica. Mostrar para a população o cientista real. E os diversos tipos de cientistas que existem.
É claro que muitos cientistas estão de jaleco branco em um laboratório. Mas nem todos passam a maior parte do tempo assim.
Com este livro mostramos a cara de alguns cientistas da vida real.
Inclusive, nós tivemos a ideia de colocar a foto dos autores dos capítulos no final do livro. Assim, nós conseguimos mostrar a verdadeira imagem de alguns cientistas.
Na opinião de vocês o que poderia ser feito para as pessoas perceberem a importância da pesquisa no dia a dia da vida das mesmas?
Divulgação científica, extensão, alfabetização científica, aproximar as instituições de pesquisa com o público no geral, “sair” do mundo acadêmico, transpor barreiras. Nesse caso a linguagem é a maior barreira! Mas é apenas questão de treinamento. Nós fizemos isso na disciplina e fazemos isso todos os dias para falar de ciência! Temos que falar de ciência, pesquisa científica, vida acadêmica… no bar, no elevador, com a nossa família, nossos vizinhos. Devido as dificuldades técnicas de linguagem, acabamos por evitar de falar sobre isso, ou simplificamos ao extremo o que perde muito da sua significância. É um treinamento. Todo cientista deve treinar e ter a prática e gosto de falar sobre o que faz com qualquer pessoa. Essas práticas diárias irão popularizar a ciência, e, o mais importante, poderá dar expectativas de que é possível ser cientista e fazer ciência. Não precisa ser algo distante da realidade cotidiana e da maioria das pessoas. É um trabalho que precisa de dedicação, treino, uso de técnicas específicas, com algumas características pessoais específicas, como qualquer outro trabalho ou profissão.
Qual o melhor conselho que algum jovem que pense em seguir pelo ramo das pesquisas pode ouvir?
Essa é uma pergunta bem difícil de responder! Não pela resposta em si, mas é que infelizmente no Brasil, estamos passando por uma crise na ciência! A realidade é que ser pesquisador e cientista no Brasil atualmente está bem difícil. Não temos financiamento, não abre concursos, não temos muitos postos de trabalho, e o nosso trabalho está sendo cada vez mais desvalorizado. Esse também é um dos motivos que a divulgação científica está sendo tão necessária. Além de todos os problemas ambientais, na saúde e descrédito na ciência, muito devido ao não entendimento de como a ciência funciona. Com isso, o que podemos aconselhar a quem quer seguir nesse ramo, é saber que o caminho é longo e difícil, mas trabalhar com o que se ama, não tem preço! Procure áreas que tenham finalidade social clara pois a ciência tem como uma de suas finalidades auxiliar o desenvolvimento e progresso da humanidade. Para concluir… Ser cientista é muito bom. Nós fazemos pesquisa, nós fazemos ciência. Trabalhar com o que ama é recompensador. Cada descoberta que fazemos com o nosso trabalho é uma alegria. E devemos levar essas descobertas para o público, tanto com artigos científicos como com a divulgação científica.
Para terminar, por favor, falem um pouco dos temas que são abordados no livro.
O livro é composto por 13 capítulos. Cada aluno da disciplina escreveu um capítulo. Os capítulos são variados. Vai desde geofísica, passando por paleontologia, mudanças climáticas, biologia marinha e vertebrados.
Capítulo 1. Super-heróis do mundo real e o poder da ciência – O Geofísico
O pesquisador Marcos Vinícius Moraes dos Santos escreve sobre como é o trabalho de um geofísico. É um trabalho que parece complexo de se explicar quando não usa palavras para o público leigo. O autor usou super-heróis para poder ilustrar como é o trabalho desse tipo de profissional.
Capítulo 2. Paleo o quê?! – A vida de uma paleontóloga
A pesquisadora Hanna Carolina Lins de Paiva segue com um capítulo sobre paleontologia. É uma profissão com grandes oportunidades de fazer descobertas sobre o passado de nosso planeta. A autora descreve o projeto de pesquisa dela e conta o que é ser uma paleontóloga com trabalho de campo e no laboratório.
Capítulo 3. Mudanças climáticas: Conhecer o presente, desvendar o passado e prever o futuro
A pesquisadora Kamila da Matta Agostini começa um assunto super atual, que é as mudanças climáticas. Ela aborda mais especificamente os ciclones e os grãos de pólens que são levados por eles. E com isso pode-se desvendar o passado. Ela explica como o passado, o presente e o futuro estão ligados.
Capítulo 4. O Invisível das Mudanças Climáticas
Seguindo com o tema sobre mudanças climáticas, a pesquisadora Daniela Kozlowsky aborda micro-organismos em geleiras. Ela escreve sobre os derretimentos em geleiras e aborda o estudo de vírus no ambiente pró-glacial.
Capítulo 5. Ciência e você: uma parceria saudável para nossos rios
Com a pesquisadora Beatriz Moreira Ferreira, nós entramos para o ambiente aquático. Ela escreve sobre a importância dos rios que mantém diversas espécies de animais e plantas. Nós devemos preservar esse ambiente tão importante e que muitos se encontram poluídos.
Capítulo 6. O que é isso crescendo no meu barco? – O problema da bioincrustação marinha
Com a pesquisadora Yollanda C da S. Ferreira Vançato nos direcionamos para o ambiente marinho. E ela escreve sobre os problemas da bioincrustação. Poucas pessoas sabem que isso pode ser um problema para o ambiente marinho e que os barcos precisam ser limpos de forma correta para não prejudicar o meio ambiente.
Capítulo 7. Atravessando oceanos: o que acontece quando uma espécie decide se estabelecer em um novo local?
A pesquisadora Larissa Marques Pires Teixeira escreve sobre os problemas de uma espécie que se estabelece em um local que não ocorria antes. Existe uma disputa embaixo d’água que é estudada pela cientista. E ela conta a história do Coral Sol que chegou no Estado do Rio de Janeiro na década de 80, fixado nos pilares de uma plataforma de petróleo, vinda do Oceano Pacífico e os problemas que isso causa para as espécies nativas.
Capítulo 8. Vivendo e resistindo no mar
A pesquisadora Juliana Magalhães de Araujo conta que no ambiente marinho existem objetos como sacolas plásticas, linhas de pesca, latas de alumínio, tampinhas de garrafa plástica e pedaços de isopor. Isso prejudica inúmeros espécies, incluindo o coral Orelha-de-elefante. Ele é uma fonte importante de substâncias químicas que possuem atividade contra bactéria resistente a diversos antibióticos. E essa espécie de coral está estampada na nossa nota de Cem Reais.
Capítulo 9. Dando nome às esponjas: como e por quê?
O pesquisador Humberto Freitas de Medeiros Fortunato escreve sobre a importância da taxonomia. Esta área é uma das mais antigas e mais importantes na Biologia, porque serve de base para estudos mais avançados. A taxonomia tem o objetivo de descrever características morfológicas presentes em um organismo e, a partir destas características, classificar os organismos em grupos.
10. Se esquentar o sapo foge, mas se reflorestar o sapo volta?
Com a pesquisadora Quezia Ramalho chegamos nos vertebrados. Ela escreve sobre as atividades antrópicas que têm provocado várias mudanças climáticas que ameaçam a biodiversidade, e os anfíbios são muito afetados, são muito sensíveis. Para algumas espécies, se esquentar, os bichos fogem para locais com temperaturas mais adequadas. Isso considerando um cenário otimista, em que os bichos podem fugir, mas a verdade é que muitas espécies podem até morrer por causa das alterações climáticas. E se reflorestar, os bichos voltam?
Capítulo 11. Por que precisamos preservar os répteis?
A pesquisadora Luisa Maria Diele-Viegas conta a importância dos répteis e porque precisamos preservá-los. Existem répteis de topo de cadeia, como o jacaré; lagartos que fazem o controle de insetos; e também alguns répteis que servem de alimento para outras espécies. Além disso, as plantas que precisam dessas espécies como dispersoras de suas sementes e polinizadoras. Outra grande vantagem que os répteis podem trazer para nós é o uso medicinal do veneno das serpentes.
Capítulo 12. A Floresta: Habitat de Vidas Secretas
O pesquisador Rodrigo Paulo da Cunha Araújo fala sobre o trabalho com os pequenos mamíferos, que são os roedores e marsupiais. Ele escreve sobre onde esses animais vivem e suas adaptações; a dieta que é bem variada; e que são ótimos bioindicadores de contaminantes (metais pesados, químicos) no meio ambiente.
Capítulo 13. Biólogos: Os detetives da conservação
E o livro se encerra com o capítulo da pesquisadora Priscila Stéfani Monteiro Alves que escreve sobre mamíferos brasileiros de médio e grande porte. Ela destaca a importância dos mamíferos silvestres na natureza. E descreve como é o trabalho para estudar esses animais.
O Blog da EdUERJ agradece a entrevista e deseja que o sucesso do livro continue!
Entrevista concedida a Talita Escócio (estagiária de Relações Públicas da EdUERJ), sob supervisão de Ricardo Zentgraf