“Teorias da autoficção”, de Anna Faedrich, lançamento da EdUERJ, descortina as múltiplas facetas que surgem a partir de uma vertente literária que ousou mesclar o real ao imaginário.
Uma relevante parte da história da autoficção remete a 1977 quando Serge Doubrovsky publica “Fils”, e apresenta ao mundo um neologismo para batizar sua própria obra. Não obstante, isto não significava o nascimento naquele momento de um novo estilo, uma vez que o próprio Doubrovsky reconheceu a existência da autoficção em obras anteriores à sua. Entre elas, Retrato de um artista quando jovem (1916), de James Joyce, Nadja (1928), de André Breton e La naissance du jour (1928), de Gabrielle Colette.
Doubrowsky aponta que na autoficção existe um apelo muito forte da questão histórica e muitas inspirações do estilo surgiriam a partir de contextos como o da Segunda Guerra. O livro da EdUERJ possibilita acompanhar as teorias que acompanharam a formatação dessa modalidade literária.
Na obra, Faedrich analisa a origem do termo na França; o debate teórico a respeito do conceito de autoficção, as divergências teóricas entre as diferentes “escolas” da autoficção (Serge Doubrovsky, Vincent Colonna, Gérard Genette, Jacques Lecarme, Philippe Gasparini, Philippe Vilain, Jean- -Louis Jeanelle, Régine Robin, entre outros). Além disso, destaca os estudos críticos sobre o tema realizados no Brasil, por escritores e pesquisadores de literatura íntima.
Em outro viés, a autora explica como a autoficção dialoga com os tempos atuais, e cita obras como “o show do eu” da escritora Paula Sibilia e A sociedade do espetáculo, de Guy Debord, além de aludir aos mitos de Narciso e Sísifo. Para a autora, essa “literatura de linhagem introspectiva é a tentativa de uma busca pela verdade interna, é um exercício de refletir, no sentido de pensar sobre, ultrapassando o reflexo das águas e o dos espelhos, num movimento de mergulho em si mesmo através da escrita literária”.
Essa autoficção não é uma autobiografia e não alude ao passado. Seu aspecto principal é a indecidibilidade. “Rompe-se com o princípio de veracidade do pacto autobiográfico, sem que se entre totalmente no princípio de invenção, do pacto romanesco/ficcional. Mesclam-se os dois, resultando no contrato de leitura marcado pela ambiguidade e na narrativa intersticial”, explica.
O livro é enriquecido no último capítulo com entrevistas com nomes como Adriana Lisboa, Silviano Santiago, Michel Laub, Ana Cláudia Viegas, Cristovão Tezza, Eurídice Figueiredo, Gustavo Bernardo, Ricardo Lísias e outros.