Marcelo Guerra Santos, junto com Augusto Cesar Pêssoa e Lana da Silva Sylvestre, são os editores de “Samambaias e licófitas do Brasil: biologia e taxonomia”. O livro da EdUERJ é um dos semifinalistas da primeira edição do Jabuti Acadêmico. Marcelo concedeu uma entrevista ao Blog da EdUERJ sobre a publicação, trabalho que reuniu 41 pesquisadores brasileiros.
Blog da EdUERJ: O livro “Samambaias e licófitas do Brasil”, do qual você é um dos editores, está entre os dez semifinalistas do Prêmio Jabuti Acadêmico na categoria Ciências Biológicas, Biodiversidade e Biotecnologia. Você poderia descrever qual é a proposta do livro em questão?
Marcelo Guerra Santos: Percebemos que havia uma grande demanda de um livro em língua portuguesa sobre samambaias e licófitas que fosse destinado aos cursos de graduação e pós-graduação em Ciências Biológicas, Botânica e áreas afins. A pouca literatura existente não abordava conceitos e metodologias atuais no estudo destes grupos de plantas, assim como não davam destaque aos estudos realizados na flora Neotropical e, em especial a brasileira. Ou seja, gostaríamos de editar um livro que refletisse a importância e o destaque ambiental que as samambaias e licófitas possuem para a sociedade e o planeta.
Blog da EdUERJ: O que representou essa indicação para você e para os coeditores?
Marcelo Guerra Santos: Recebemos com imensa alegria a indicação. Um reconhecimento ao trabalho árduo de 41 pesquisadores/professores brasileiros ao estudo e disseminação dos conhecimentos sobre as samambaias e licófitas.
Blog da EdUERJ: Fale um pouco sobre o processo que culminou na publicação deste livro. Como foi o desafio de reunir tantos autores em uma pesquisa tão abrangente?
Marcelo Guerra Santos: A ideia do livro nasceu em 2008, durante o Congresso Nacional de Botânica. No entanto, o livro só começou a ser produzido em 2015 pelo Núcleo de Pteridologia da Sociedade Botânica do Brasil. Ele levou sete anos para ser concluído, até ser finalmente publicado em 2023. Trata-se de uma obra extensa e complexa, com 13 capítulos e 540 páginas ricamente ilustradas. Contou com a participação de 41 autores brasileiros de 20 universidades/institutos de pesquisa federais, cinco privados e duas estaduais. Além de 14 revisores científicos de oito universidades/institutos de pesquisa federais, duas estaduais, uma privada, e duas internacionais. Foi desafiador para nós, os editores, articular tantos pesquisadores com temas tão distintos dentro da Pteridologia. E durante a produção do livro, ainda enfrentamos a Pandemia de Covid-19, com todos os desafios e perdas que ela nos trouxe.
Gostaríamos de externar a nossa gratidão aos companheiros autores e revisores científicos que acreditaram e nos auxiliaram na construção dessa importante obra da Botânica brasileira.
A obra foi inteiramente custeada pelos autores. Fizemos questão que, ao menos o e-book, fosse de acesso livre e gratuito a todos os interessados. Acreditamos na Ciência livre e sem fronteiras.
Blog da EdUERJ: Na sua opinião, qual é o maior mérito da obra? O que você destacaria como suas principais contribuições para o campo?
Marcelo Guerra Santos: O grande mérito da obra foi a construção coletiva de 41 pesquisadores brasileiros com destaque acadêmico nacional e internacional em suas respectivas áreas de atuação. O livro representa o expressivo avanço que a pteridologia – estudo das samambaias e licófitas – alcançou no Brasil nas últimas décadas.
A principal contribuição é a pluralidade de temas em pteridologia que o livro aborda, algo até então inédito na literatura científica nacional. O livro fornece conhecimentos básicos e avançados no estudo das samambaias e licófitas, tais como morfologia, história evolutiva, taxonomia, sistemática, filogenia, biogeografia, conservação, ecologia, fitoquímica e etnobotânica. Uma verdadeira fonte de inspiração para os estudantes de Botânica e Ciências Biológicas.
Blog da EdUERJ: Quais são as principais contribuições que a pesquisa sobre pteridófitas e licófitas pode oferecer para a sociedade?
Marcelo Guerra Santos: Antes de responder a pergunta, cabe aqui um esclarecimento sobre os termos “pteridófitas”, samambaias e licófitas. “Pteridófita” é um termo informal utilizado para se referir as samambaias e as licófitas. No entanto, trata-se de um grupo artificial. As samambaias e a licófitas são linhagens diferentes de plantas, e não são agrupadas naturalmente. Não é um erro utilizar o termo “pteridófitas”, mas é importante saber o seu significado quando ele é empregado.
Quanto a importância dessas plantas para a sociedade, gostaria de destacar que há um fenômeno denominado pelos cientistas como “Impercepção Botânica”. De modo bem simples, é a incapacidade que as pessoas têm em perceber as plantas e a sua importância. Também existem plantas que são menos percebidas que outras. Dentro desse grupo de plantas negligenciadas estão as samambaias e licófitas. O fato delas não possuírem flores ou frutos pode explicar, em parte, essa menor atenção.
No entanto, são plantas importantíssimas para a estrutura da vegetação em diversos ambientes onde ocorre, participando de diversos processos ecológicos e serviços ecossistêmicos. Cabe aqui destacar que a importância das plantas e dos outros elementos da natureza não está somente em seu uso e aplicação direta pela humanidade, mas também na contribuição deles para o equilíbrio ambiental do planeta.
Diversas espécies de samambaias estão sendo utilizadas como modelo de estudo em diferentes áreas, como a citogenética, a biogeografia, e nos efeitos das mudanças climáticas.
Dentre os usos mais diretos, talvez o mais conhecido seja o ornamental, que gira um mercado milionário em todo o mundo. Mas, existem samambaias comestíveis, medicinais e de uso espiritual. Para certos povos, como os Māori – povos originários da atual Nova Zelândia – as samambaias possuem um papel de destaque na sua cultura e expressão artística.
Poucos sabem, por exemplo, que as samambaias e licófitas tiveram um papel fundamental na Revolução Industrial. Todo o carvão mineral utilizado naquela época, e ainda nos dias atuais derivam da morte e soterramento de espécies de samambaias e licófitas enormes que viviam no Carbonífero (há cerca de 300 milhões de anos).
Blog da EdUERJ: Você acredita que este livro apresenta um novo panorama para o campo no Brasil? Em que aspectos ele pode influenciar futuras pesquisas e estudos?
Marcelo Guerra Santos: Desde a concepção do livro, a nossa intenção foi demonstrar a maturidade e as mudanças de paradigmas que a Pteridologia sofreu no Brasil, principalmente nas últimas décadas. O nosso desejo é que o livro sirva como fonte de inspiração para toda uma nova geração de alunos e futuros pesquisadores.
O Dr. Paulo G. Windisch, um dos maiores pteridólogos do Brasil, em seu prefácio ao livro destaca: “Novos métodos de trabalho estão sendo rapidamente assimilados e, inclusive, melhorados, graças a uma criatividade inata dos nossos jovens que sabem buscar alternativas quando meios sofisticados não estão disponíveis. Por outro lado, a maturidade de nossa Pteridologia é atestada pela interação de muitos dos autores dos capítulos aqui apresentados com renomados pesquisadores de instituições estrangeiras de primeira linha.”
O livro Samambaias e licófitas do Brasil: biologia e taxonomia está disponível em versões impressa e epub: