Personagens que brotam de processos à margem da sociedade, e que experimentam ou expressam a violência de forma recorrente em seus cotidianos. O que podem revelar essas vozes dissonantes em relação ao pensamento hegemônico de uma sociedade? Esta questão está no cerne de Na ponta da língua – literatura, política e violência em Os sertões, Native Son e Cidade de Deus, lançamento da Editora da UERJ.
Sob o prisma da literatura comparada, o livro de Carolina Correia dos Santos analisa Os sertões, de Euclides da Cunha, lançado em 1902; Native son, de Richard Wright, publicado em 1940 e Cidade de Deus, de Paulo Lins, objeto de diferentes edições a partir de 1997. São narrativas que transitam em recortes temporais distintos e que, em comum, reverberam questões como racismo, injustiça e exclusão sociais, além de ter a violência como um componente essencial. Em muitos aspectos, são representativas da visão dos escritores sobre a sociedade, que vieram a se tornar também uma referência em termos culturais ou sociais.
“Em Os sertões, o sertanejo tem papel fundamental na criação artificial da ethnie brasileira, gerando um discurso de fundação do Brasil típico das nações ocidentais do século dezenove”, aponta Carolina Correia dos Santos, no capítulo dedicado ao livro de Euclides da Cunha.
Na ponta da língua reflete também sobre Native son, escrito por Richard Wright, escritor negro pioneiro ao abordar o racismo e a segregação racial nos EUA, e sobre Cidade de Deus e o viés pelo qual se delineiam, em suas páginas, situações que ocorrem a moradores das comunidades.
Para a autora, os três livros estudados “lidam com raças, grupos inferiorizados socialmente, ou melhor posto, com bandos que desafiam o Estado: sertanejos, negros e favelados”.
Na Ponta da Língua propõe uma comparação entre essas criações literárias e procura perceber em que medida os conteúdos dialogam com o discurso hegemônico das classes dominantes ou do Estado. Além disso, apresenta diversos segmentos de críticas e análises dos referidos livros, evidenciando a forma como foram recebidos ou interpretados.
A publicação da EdUERJ se insere no âmbito dos estudos pós-coloniais, renegando a concepção arcaica de literatura do continente como resultado bem-sucedido entre uma experiência universal e local.
O livro está disponível em versões impressa e ebook.