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Os “indesejáveis” nos primórdios da República

O ato de imigrar implica não só o deslocamento, mas uma tentativa de adaptar-se a uma nova sociedade, levando consigo muitas experiências obtidas em seu país de origem. Essa vivência torna-se um desafio quando a nova moradia pretende ser estabelecida em um país inóspito e repleto de mecanismos de coação àqueles que não julga bem vindos.

A discriminação a estrangeiros está encrustada na história da sociedade brasileira e remete aos primórdios da República. E mais constante do que se imagina, o mecanismo de coação implementado pelo Estado ocasionou a expulsão de imigrantes, como comprova Os indesejáveis: desclassificados da modernidade. Protesto, crime e expulsão na Capital Federal (1890-1930)  , de Lená Medeiros de Menezes.

Publicado em parceria pela EdUERJ e Editora Ayran, a segunda edição de Os indesejáveis oferece um singular panorama do Rio de Janeiro da  Belle Époque, caracterizado como um cenário potencialmente auspicioso, instigado por adventos como o fim da escravidão e a implementação da República, que sugeriam novas possibilidades, não só de desfrutar a vida, mas de se prosperar financeiramente. Todavia concomitante a essa sociedade charmosa havia a faceta brutal do Estado que, para garantir a ordem, inerente a essa aparência de modernidade, impunha ditames “civilizatórios”, de prontidão a atender a padrões higienistas que convinham principalmente aos anseios das elites oligárquicas.

Implacável, o poder público impôs-se a militantes políticos que não comungavam da mesma concepção política governamental, como anarquistas e comunistas, e combateu também aqueles que, desafortunados em seus países de origem, também enveredaram por descaminhos na terra brasilis, cometendo pequenos delitos ou entregando-se ao alcoolismo ou aos jogos de azar. Com uma mão pesada, asseverou-se de punir também os indigentes, os enfermos e os inválidos, por serem considerados mera despesa aos cofres públicos. A historiadora Lená de Medeiros traz muitos relatos que aludem a diversas dessas situações dos estrangeiros e suas sinas. No final das contas, como saldo, a história registra milhares de portugueses, italianos, espanhóis, franceses, russos e outros expulsos do Brasil. Ao sonho da vida bem sucedida contrapôs-se a deportação, tantas vezes em um porão de navio, de volta aos países de origem, sob acusação de contravenção, vadiagem ou crimes políticos.

O livro é referendado por uma minuciosa pesquisa, que inclui documentos oficiais (relatórios ministeriais e dos chefes de polícia, código penal, legislação da época, discursos parlamentares, correspondência diplomática, atos internacionais e oferece até mesmo uma lista de expulsos do Brasil.

Justamente por essa qualidade da pesquisa e pertinência do tema, trata-se de uma obra que merece a sua atenção.